segunda-feira, 4 de junho de 2007

O rapaz do neurónio*

Habituei-me ao Rapaz (chamemos-lhe assim, como se de um nome próprio se tratasse) com demasiada facilidade. Na verdade acho-lhe graça. Para ele todos são “Professor” ou “Professora”, conforme se encaixe na natureza masculina ou feminina: o porteiro, o motorista, a secretária, o técnico, a empregada da limpeza, os engenheiros, os doutores e os que o são de facto - professores - uma minoria. A única condição que impõe para tal tratamento é que sejam mais velhos (o que passa a ser deveras interessante quando sabemos que (só) tem 22 anos). Lá calha aparecerem umas caras mais novas. O sorriso rasga-se e o tratamento passa a informal: “Queres a meia-de-leite mais escura ou mais clarinha?”. A pergunta, perfeitamente desnecessária dado que a tira sempre da mesma maneira, serve simplesmente o propósito do tratamento tu-cá-tu-lá. Estou sempre à espera que apareça uma menina que, não sendo ainda professora, não ache graça àquelas "liberdades".

Invariavelmente, entre as 18h e as 18h30m subo, até ao bar, para um café. Quando vou não tenho pressa. Se a tenho, sei que é melhor não ir. Para o Rapaz não há stresses, a velocidade é sempre a mesma. Se tem dez clientes atende um de cada vez. É uma receita básica, elementar. Se os dez querem café, só café, basta-lhes aguardar que o Rapaz repita vez, após vez, após vez, o mesmo procedimento: vazar a borra na respectiva gaveta, com 2 ou 3 pancadas (um barulho que me enerva sobremaneira), encher o recipiente com café novo, tirar a bica, servir, receber o dinheiro, fazer o troco (é bom que hajam trocos na máquina porque entre o pedir 5 cêntimos para “facilitar”, recebê-los e devolver a diferença a coisa pode durar, durar, durar) e passar ao cliente seguinte.



*McCulloch e Pitts escreveram:
A lei de tudo-ou-nada da actividade nervosa é suficiente para assegurar que a actividade de um neurónio pode ser denotada por uma proposição. As relações fisiológicas que existem entre actividades nervosas correspondem, então, às relações entre proposições, isto é, uma rede de conexões entre proposições simples pode originar proposições complexas.

1 comentário:

Prof disse...

Em suma, é preciso ter muita paciência para que o Rapaz nos sirva um café...
Beijos!